Comunicação padece com projetos na gaveta e falta de políticas públicas

Os últimos encaminhamentos conferidos ao Projeto de Lei nº 29/2007 ratificam a já histórica constatação de que, no Congresso Nacional, a gaveta é o destino das propostas que possam contribuir para esboçar um marco regulatório voltado à comunicação. E atestam também que os sucessivos governos são incapazes de estabelecer políticas públicas para o setor, deixando sempre essa tarefa para o mercado.

“No Brasil, é muito difícil pensar a comunicação nas suas verdadeiras dimensões”, observa Celso Schröder, coordenador-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). Na sua opinião, o fato de o PL 29 ter deixado a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara e ser encaminhado à Comissão de Defesa do Consumidor (CDC) sem incorporar os avanços obtidos com o debate – como a produção e distribuição de conteúdo nacional – deixa evidente a situação do País quanto ao setor. “Continuamos submetidos unicamente aos interesses do mercado. Mais uma vez, o Executivo abdica de contribuir para a democratização da comunicação e demonstra sua incapacidade de entendê-la como um direito social”, acrescenta Schröder, que conclui: “Ao governo, parece valer apenas as dimensões mercadológicas da comunicação”.

Schröder lembra, mais uma vez, que, mesmo com críticas ao PL 29, o texto acrescido das contribuições na CCTCI representava um enorme avanço em vários pontos, contribuindo sobremaneira na construção de um instrumento regulatório para o setor da comunicação social eletrônica (leia matéria).

Para Roseli Goffman, integrante da Coordenação Executiva do FNDC e do Conselho Federal de Psicologia (CFP), qualquer proposta que tramite na Câmara visando produzir um marco regulatório tem o mesmo destino: as gavetas. Mesmo que procure apenas garantir pequenas conquistas, como a gradual regulamentação da responsabilidade social das empresas. Prevalece a pseudo-regulação, como no caso das posições empresariais contrárias ao PL 29. “A pseudo-auto-regulação do mercado em relação às TVs por assinatura promove um ilusionismo junto à opinião pública, ora recorrendo à pirotecnia através da veiculação de spots ou de depoimentos na mídia escrita que são verdadeiros simulacros e nada têm a ver com o que se assiste na programação destes veículos”, analisa Roseli, referindo-se à campanha da Associação Brasileira de TVs por Assinatura (ABTA) contra o PL 29.

A propósito da responsabilidade social das empresas, Roseli exemplifica referindo-se ao Projeto de Lei 5921/2001 do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB/PR), que proíbe a publicidade de produtos infantis. Depois de ser relatado pela deputada Maria do Carmo Lara (PT/MG), o PL foi aprovado em julho último pela Comissão de Defesa do Consumidor. “No dia 5 de setembro, abriu-se o prazo para emendas ao projeto, depois de sete anos. É como colocar o anunciante cuidando da publicidade dirigida às crianças. Faço esta ressalva porque essa matéria já é regulada em vários países, e aqui atravessa uma verdadeira ‘via crucis’ pelas comissões, sem obter um parecer conclusivo”, destaca.

É por razões como essas – afirma Roseli – que entidades e movimentos sociais lutam pela criação, pelo Executivo, do grupo de trabalho preparatório à Conferência Nacional de Comunicação. “Com a realização de uma conferência, as demandas da sociedade deverão impulsionar a construção de um marco regulatório deste segmento de fundamental importância para a democracia em nosso país”, declarou.

José Luiz do Nascimento Sóter, representante da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço) na Coordenação FNDC, acredita que ações coordenadas impedem a tramitação dos projetos no Congresso. Ele cita como exemplo o relatório substitutivo que altera a Lei nº 9612/98 (regulamenta a radiodifusão comunitária) e está para ser votado desde maio. “Tudo que vai ao encontro à proposta de democratização dos meios de comunicação emperra tanto no governo quanto no Congresso”, afirmou.

Outro caso lembrado por Sóter diz respeito à descriminalização das rádios comunitárias, “Fomos chamados ao Ministério da Justiça para debater o assunto em agosto deste ano. Sabemos que houve uma reação fortíssima dos meios comerciais, inclusive com ação na mídia envolvendo a Polícia Federal e a fiscalização da Agência Nacional de Telecomunicações, dizendo que a legislação é branda e que, por isso, estimula a proliferação das rádios clandestinas. Em conseqüência, não se ouviu falar mais do projeto”, disse Sóter. “Hoje a gente pode afirmar com todas as letras que o Estado, como um todo, está completamente refém da vontade do mercado em relação à comunicação social no país”, avaliou.

Fonte: Imprensa FNDC