IV Encontro Nacional de Negros e Negras da Fasubra

IV Encontro Nacional De Técnicos Administrativos Em Educação Negros E Negras E Militantes Anti-Racismo Das Universidades Brasileiras

Realizado entre os dias 19 a 21 de junho de 2008, o IV Encontro de Técnicos Administrativos em Educação Negros e Negras e Militantes Anti-Racismo das Universidades Brasileiras construiu um sólido debate sobre o movimento negro no Brasil, sobre a construção de políticas para a promoção da igualdade racial, ações afirmativas – em especial a política de cotas na educação – e como construir táticas e ações para combater a discriminação dentro das Instituições de Ensino Superior.

PARTICIPANTES:

• Direção Nacional: Luizão, Rolando, Léia, João Paulo, Luiz Antonio, Graça, Vera, Paulo Henrique, Maria Ângela e Loiva.
• Convidadas pela FASUBRA: Niversina e Jupiara.
• Entidades de Base: Adil, Marcelo, Socorro Marzola e Márcia Abreu (SINTFUB); Adilson (SISTA-MS); Gilson e Eduardo (SINT-UFG); Cosme, Cléa, Gislene, Itamar, Janaina, José Carlos, Maria do Carmo, Maria José, Marina, Rosangela e Yone (SINDIFES-BH); Carlos Alberto, Jorge Luiz, Eliane, Noemi e Sebastião (SINTUFRJ); Claudio Bezerra, Emanoel Catarino e Heleno (SINTEMA); Paulo Ronaldo (ASSUFSM); Maria das Graças e Tereza Cristina (SINTUFCE); Gilson, Joana, Schakal, Maria de Lourdes, Maria Marlene, Maria Schirley, Nara, Oneida, Orencio e Zoel (ASSUFRGS); Girlaine, José Zilton, Marlúcia, Umberto e Noelma (SINTUFAL); Heloiza Helena, Leila, Rute Helena (SINTUFF); João Teófilo e Luiz Carlos (SINTESAM); Magna e Marisa, (SINTET-UFU); Ivanilda e José Kirk (SINTUR-RJ); Loila e Maria Antonia (SINTE-MED); Rogério (SINTUFEJUF); Maria do Socorro e Paulo (SINTUNFESP).
• Outras Entidades/Instituições: Edemilson Jorge Xavier (HU SM); Ivete Rodrigues Macedo e Silva (UNIFESP); José Antonio Monteiro (CTB-AL); Manoela Alves da Silva (AEC/BSB); Eliane Maria Pereira (UNEGRO); José Roberto da Silva (COLÉGIO NOTRE-DAME); Paulo Costa (SINTRAJUFE); Maria Corina Dantan e Chico Piauí (CÂMARA DOS DEPUTADOS).

79 participantes (dos quais 9 são de outros sindicatos, movimentos sociais, representantes de instituições e de parlamentares)
17 Entidades de Base da Federação

DIA 19/06/2008

09h00: Abertura

Apresentação de vídeo “A CANÇÃO DO HOMEM”, contendo imagens e sons da África. A riqueza das imagens contidas no vídeo apresenta o povo africano, refletindo o significado da vida bem como seus valores culturais, éticos e morais, retratados na canção, que perpassam desde o nascer até a morte de cada homem e de cada mulher.

Ao final, foi feita uma homenagem (in memoria) ao companheiro José Paulo (PAULÃO), recordando seu comprometimento na luta contra o racismo tanto por dentro do SINTUFRJ e da FASUBRA, como dos movimentos sociais. Naquele momento, Luizão, Coordenador de Políticas Sociais e Anti-Racismo da FASUBRA, saudou a todos os participantes, registrou e agradeceu a colaboração do SINTUFRJ pela cessão do vídeo à Comissão Organizadora do Evento.

09h30m: Mesa de Abertura

Finda a apresentação do vídeo, foi constituída a Mesa de Abertura pelos seguintes participantes: Leia, João Paulo e Luiz Antonio (Coordenadores Gerais da FASUBRA); Marcos Benedito (Presidente do CNCDR/CUT); Luiz Henrique Schuch (Secretário Geral do ANDES); Rosane Sousa do Nascimento (Secretária de Políticas Sociais da CNTE) e Jacira da Silva (MNU). Foram justificadas as ausências de representantes do MEC, ANDIFES, SEPPIR e UNE. Todos fizeram uma fala breve de saudação, ressaltando a importância do evento que objetiva debater e apresentar propostas com vistas à construção de políticas para a promoção da igualdade racial.

11h00: Conferência Magna: “Brasil mostra sua cara” – o papel da Secretaria Especial de Políticas de Promoção para a Igualdade Racial – SEPPIR

Palestrante: Ivete Maria Barbosa Campos (Assessora Técnica)

A Representante da SEPPIR, Ivete Maria Barbosa Campos, foi responsável pelo debate de apresentação de políticas governamentais para a promoção da igualdade racial e de combate ao racismo. Ao apresentar as políticas da SEPPIR hoje, transformada em Ministério, Ivete argumentou que as dificuldades são muitas na luta pela promoção da igualdade racial, a começar pela formação escolar brasileira que ainda é de predominância européia. Afirmou que a proposta de branqueamento como tendência da sociedade ainda é permanente e que o povo brasileiro ainda tem problemas na sua afirmação de raça, o que considera um racismo inconsciente.

Afirmou que a SEPPIR traça políticas para a população negra no país, que hoje já ultrapassa 50% da população. A transversalidade é a marca na atuação da SEPPIR na construção de políticas. A Secretaria faz parceria com os ministérios na sua atuação em saúde, educação e trabalho, além de outros. Continuando, afirmou que é preciso enxergar as diferenças que existem na saúde da população negra, o que deve ser respeitado, dando um enfoque diferenciado das políticas de saúde em geral – como no caso da anemia falciforme, que ocorre na população negra e que não pode ser tratada como uma anemia comum. Então, a parceria com o Ministério da Saúde visa estas e outras políticas, como a saúde da mulher negra, que possui incidências de câncer diferenciadas da mulher branca, por exemplo. Até bem pouco tempo, a saúde brasileira constituía seus tratamentos apenas no viés da saúde branca.

Na Educação, citou como importante a construção da implementação da Lei 10.639, que institui o estudo da historia da áfrica na grade curricular da educação básica. Afirmou que as resoluções de educação, construídas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)), não tratam da introdução da cultura negra na educação para mudar a visão que temos de que todo o conhecimento é oriundo da Europa. Que é preciso ver a população negra como formadores, como construtores da cultura brasileira. Argumentou que ao mudar a temática da educação no ciclo básico está se trabalhando para a redução do racismo. Ivete afirmou que “ninguém nasce racista, mas aprendemos a ser racistas”.

Sobre os Quilombolas, argumentou que esta é a forma mais antiga de organização do movimento negro. Mais de 2.000 quilombos remanescentes foram mapeados e apenas 20 terras quilombolas foram regulamentadas. O que significa que é preciso ter ações mais contundentes e trabalhar as parcerias governamentais para agilizar estes procedimentos. Neste sentido, existe uma parceria com o INCRA, MDS, Fundação Palmares, Ministério da Agricultura, mas, que existe muita resistência nos processos de regulamentação.
Continuando, Ivete afirmou que a população carcerária tem cor e esta cor é negra. Neste sentido, é preciso ter a percepção de fazer um trabalho de re-inserção do negro que sai do sistema prisional, para que o mesmo tenha condições objetivas de se inserir normalmente na sociedade.

Sobre outras etnias, afirmou que existe um trabalho sendo construído com a população cigana, que também sofre preconceito. Foi detectada a necessidade de um projeto de escolarização própria para a população cigana.

Para a População indígena, a temática deve ser abordada na formação escolar para construir a percepção da importância indígena na construção da cultura brasileira, e que a população indígena está mais organizada que a população negra na conquista de direitos. Os índios têm políticas de saúde e de educação em estagio mais avançado que o da população negra.

Sobre o plano nacional de implantação da lei 10.639, Ivete afirmou que a linha é de inclusão da implementação da lei, nos Planos Municipais e Estaduais de Educação.

Quanto ao debate de cotas, afirmou que existe uma enorme resistência à implantação, o que demonstra o quanto precisamos ainda avançar para garantir ações que busquem a promoção da igualdade de direitos. Informou da existência de abaixo assinado no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir o Projeto de Lei (PL) de Cotas e classificou esta ação como um absurdo, uma reação do projeto de manutenção da sociedade como hoje se constitui: com uma enorme desigualdade na promoção de direitos raciais. “É preciso entender que cotas é uma política reparatória, não uma política permanente”, diz Ivete. Continuando, disse que, enquanto não tivermos um sistema de educação e econômico social justo, que impeça que crianças negras e pobres tenham que ir para o mercado de trabalho mais cedo, ou que não ofertem, na sua grade de ensino, igual qualidade de aprendizagem para todos os cidadãos, cotas têm que existir para garantir o equilíbrio na promoção da igualdade racial.

Ivete afirmou que a política de combate ao racismo é de responsabilidade de todos, mais que do Estado. E avaliou como avanço a projeção de dados do IBGE do aumento da população negra até 2010, como maior que o conjunto das outras etnias. Isto significa que a população está se reconhecendo enquanto raça. Afirmou que são muitos anos de invisibilidade para serem desconstruídos e que, quando existiam legislações que proibiam negros, negras e ex-escravos de acessarem as escolas, não existiu reação da sociedade. No entanto, quando se avança para fim do branqueamento na política de reparação e de acesso à formação escolar encontra-se resistência muito maior do que se pode imaginar.

Quanto ao Estatuto, informou que está no Congresso e que é preciso convencer os que são contra à aprovação do mesmo. O Estatuto prevê a criação de um fundo de financiamento para políticas públicas de promoção da igualdade racial e isto gera dificuldades com os ministros das áreas econômicas do governo.

Sobre a construção de políticas de estado, a SEPPIR tem trabalhado com sistema de conferências. Tem se mobilizado para que, por dentro das conferencias que o governo tem construído nas mais diversas áreas, se aprovem políticas de reparação.

Acerca do Plano Nacional de Educação, afirmou que este tem a transversalidade nas questões de gênero e raça, na sua revisão. Que a Lei 10.639 abriu a necessidade de ofertar formação continuada aos professores da rede pública e que neste processo também é preciso ter quadros para fazer a formação necessária. Que é preciso construir um processo de interferência na avaliação dos livros didáticos que vão para a rede pública e que no caso do ensino da historia da áfrica, existem dificuldades com a ausência de um material teórico para a formação.

Sobre a saída da Ministra Matilde, disse que o processo de transição foi traumático e que a SEPPIR está se recompondo.

12h30 às 14h30m: Intervalo para almoço

14h30m: Mesa de Debate: “Políticas de ações afirmativas no Brasil e no mundo”

Debatedores: Leonor Araújo (Coordenadora Geral de Diversidade do MEC) e Carolina Pinho (Representante da UNE)
Moderadora: Jupiara Castro
Relatora: Vera Miranda

Findas as falas dos debatedores, a Mesa abriu inscrições para intervenções do Plenário.

O debate em plenária apontou ações importantes como a proposta de coleta de assinaturas pelos movimentos sociais para a construção de um PL alternativo de iniciativa popular, em apoio ao PL de cotas; o incentivo à assinatura do documento de apoio ao PL de cotas feito pela SEPPIR em combate ao abaixo assinado encaminhado ao STF; pressão e acompanhamento para a aprovação do Estatuto de Igualdade Racial; a necessidade de retorno de reuniões ordinárias do Conselho Nacional pela Igualdade Racial; políticas de acompanhamento da população quilombola para fortalecer a luta pela demarcação e titulação das suas terras, bem como de educação ambiental, evitando a degradação ambiental onde existem estas comunidades. Também foi levantando que é preciso fazer as disputas, dentro e fora do governo e nos marcos de classe e que o adversário hoje é a mídia elitista que usa a contra-informação para criar o senso comum que gera reação a políticas que avançam na garantia de direitos e políticas de reparação. Por ultimo, foi consenso no debate que a detenção do saber é fundamental para a disputa na sociedade. É preciso que a população negra tenha acesso à instrução, quantitativa e qualitativamente, para poder fazer a disputa, a começar por dentro das academias.

DIA 20/06/2008

09h00: “Movimento Negro e o Movimento Sindical – Aliado ou Parceiro”

Debatedores: Jacira da Silva (MNU), Marcos Benedito (Presidente do CNCDR/CUT) e Emanoel Julio Vieira (UNEGRO)
Moderadora: Yone Gonzaga
Relatora: Vera Miranda

Marcos Benedito (CNCDR/CUT) – iniciou o debate apresentando o endereço do blog www.cncdr.zip.net onde se pode encontrar todas as informações que envolve o movimento negro. Segundo ele, o blog é constantemente alimentado com documentos, relatórios e documentações que não caberiam todos os dias nos informes da CUT. Informou que a CNCDR possui representantes em mais de 20 estados, incluindo o Distrito Federal, portanto, é representativa. Continuando, afirmou que era preciso incorporar a idéia de que a CNCDR tem que ser reconhecida como secretaria. Argumentou que a discussão racial tem que ser encaminhada como algo importante. Sobre o tema: “movimento sindical e movimento negro – aliados ou parceiros”, propôs uma reflexão sobre o que significa ser aliado ou ser parceiro. Afirmou ter feito um apanhado de todas as coisas que o movimento sindical o movimento negro construíram juntos e que, só depois de saber o que aproxima e o que distancia na subjetividade, é que saberemos se somos parceiros ou aliados. Para isto, é preciso saber qual a estratégia que une os dois movimentos. O que unifica é a luta contra a discriminação racial, a xenofobia, todos os tipos de racismos e intolerâncias correlatas em todas as suas dimensões e que o objetivo estratégico é a cidadania plena, sem racismos, com igualdade social e racial. O objetivo é ter todos os direitos que os negros não têm.

Os instrumentos para alcançar os objetivos estratégicos são muitos e diversos. Alguns são ferramentas, outros são discursos, outros são ações de denuncia, etc. Quanto ao 13 de maio, segundo ele, não é um dia de comemoração e sim de denuncia – Dia Nacional de Denuncia Contra o Racismo. Benedito disse que temos que nos apropriar do aconteceu em 13 de maio, saber que existiu mobilização e luta, saber que José do Patrocínio, um ex-escravo, usou todos os seus recursos para libertar outros negros do cativeiro. Ainda sobre datas, é preciso saber que o dia 20 de novembro, comemorado como o Dia da Consciência Negra, surgiu da data 20 de novembro de 1625, dia em que Zumbi dos Palmares foi trucidado e morto. Zumbi morreu pela libertação do povo negro e o 20 de novembro tem que ser reconhecido como o dia da nossa libertação verdadeira. O dia 20 de novembro deve se tornar um feriado nacional.

Sobre as Cotas, Benedito disse que, se alguém ou algum movimento é contra o PL 7399 que regulamenta as cotas, não é aliado nem parceiro. Também argumentou que é preciso ajustar o PL 3198/00, que institui o Estatuto da Igualdade Racial e que, se alguém for contra a aprovação do Estatuto, não será nem aliado nem parceiro.

Outra luta que unifica é a implementação do tratado de DURBAN e o plano de ação de DURBAN. Afirmou ser importante repassar a experiência de DURBAN que é um compromisso de governo de implantar políticas de promoção da igualdade étnico-racial em seus países.
Lembrou da ICERD, uma convenção proposta pela ONU que busca a eliminação de todas as formas de discriminações, não somente no mundo do trabalho. Afirmou que a implantação da ICERD no Brasil já traria muitos avanços.

Continuando, lembrou as Convenções 100 e 111 da OIT, que tratam sobre igualdade salarial entre homens e mulheres. Ambas são importantes ferramentas na luta pela promoção da igualdade e do combate ao racismo.

Outra ferramenta importante para a construção de políticas, elaborações de ações de combate ao racismo e para a promoção da igualdade é a SEPPIR. Quem discorda da SEPPIR não é aliado nem parceiro. O apoio à política de titulação das terras quilombolas também é ação que unifica. Quem for contra, não é parceiro nem aliado.

Sobre o Congresso de Negras e Negros do Brasil (CONEG), afirmou que todos deveriam estar dentro do debate. Argumentou que este CONEG tem que discutir o mercado de trabalho também e as centrais sindicais estão fora do processo. Disse que o movimento sindical está indo de carona no debate da religiosidade, da juventude e que, no tocante ao mercado de trabalho, nada se discute. Ainda sobre o CONEG, informou que o primeiro Congresso aconteceu em Belo Horizonte-MG e que a FASUBRA estava oficialmente representada.

Jacira (MNU) – abriu sua intervenção dizendo que, quando vamos falar de nós mesmos, somos muito exigentes. Nosso papel de convencimento está no nosso conteúdo. Quanto ao tema: “movimento negro e sindical – aliados ou parceiros”, entendeu que não existe uma interrogação, mas que ficou na afirmativa. Ao remeter a uma reflexão sobre o tema, lembrou que quando foi elaborada a Carta de Princípios do MNU, nela foi colocado quem são os aliados na luta. Que o Movimento Negro, historicamente na construção com outros segmentos, não conseguia ser protagonista da sua própria história. Lembrou que existia uma angustia e uma necessidade do movimento de ser protagonista e, na construção com os outros segmentos, de buscar aliados para construir a igualdade racial.

Falando sobre o movimento sindical, afirmou que nas décadas de 70 e 80, o movimento sindical e o movimento negro eram aliados. Com a chegada das ONG’s, surgiu o termo parceiros, que confundiu se somos movimento, entidade, instituição, etc. Quanto à relação entre o sindical e o movimento negro, afirmou que o sindical nunca os viu como atores sociais e políticos, usando-os como instrumento mobilizador, porque o movimento negro é muito organizado. Continuou afirmando que muitos militantes negros foram para o movimento sindical e não se incorporaram no movimento negro porque não têm a consciência racial do que significa isto. Continuou dizendo que no campo sindical tem a discussão da nação socialista, mas nunca usam como referência de modelo socialista econômico, num Brasil que vem buscando a liberdade de negros e negras, o Quilombo dos Palmares. A referência de luta pela libertação do povo negro, que é Zumbi dos Palmares, nunca foi utilizada. Nós sempre usamos a cartilha do outro; sempre o outro e não o negro. Usamos Marx e outras referências, todas não negras.

“Existe uma fragilidade na relação entre o movimento negro e o sindical; a relação é submissa e desigual”, afirmou Jacira, quando argumentou que é sempre o movimento negro que vai de pires na mão, que nunca encontra na relação com o sindical, dinheiro, recursos, prioridade nas ações, nas plataformas sindicais, em qualquer lugar do país. Que, neste sentido, a relação tem que mudar e precisa estabelecer uma parceria de fato, não uma substituição de protagonismos.

Continuando, argumentou que não é mais possível ter uma relação desigual entre os movimentos, constituída em cima da fragilidade econômica do movimento negro. É preciso ter uma aliança com o movimento sindical mantendo o protagonismo de nossa ação. Usar a estrutura do movimento sindical ou do estado para fazer a luta é usar o direito de cidadão que paga seus impostos ou de trabalhador que contribui para com os sindicatos.

Emanuel Julio (UNEGRO) – no debate, afirmou que faz 120 anos da abolição incompleta. Que a UNEGRO é uma entidade nacional do movimento negro que faz a luta do povo brasileiro e do movimento negro, do ponto de vista de raça e de classe. Deste ponto de vista, o tema proposto para o debate “movimento negro e sindical – aliados ou parceiros”, sugere ser os dois ao mesmo tempo, mas, que obviamente, existem momentos de contradições. Há momentos em que as lutas do movimento operário e do movimento negro entram em conflito, que não unificam. Exemplo disto foi a campanha das centrais sobre a redução da jornada de trabalho, que interessa e unifica o movimento negro. Também o PL contra o trabalho escravo, pouco debatido no Congresso, no movimento negro e no movimento sindical. Esta luta interessa para nós negros, mas pouco temos discutido a respeito. Outro exemplo disto é o decreto 4.887/03 que trata da demarcação e titulação das terras quilombolas. No Espírito Santo, a ARACRUZ Celulose, está tentando tirar um conjunto de quilombolas da região e têm buscado movimento sindical como parceiros.

As parcerias e alianças, tanto do movimento negro quanto do sindical, foram construídas através do movimento negro nos sindicatos, que criaram os departamentos de anti-racismos nos sindicatos. Foram as reivindicações de militantes do movimento negro que atuavam no sindical, que permitiu a constituição de parceiras e alianças verdadeiras para construir a luta por políticas públicas de promoção da igualdade racial e de combate ao racismo. Continuando, afirmou que existem muitas dificuldades, entre elas a dificuldade de mobilizar os trabalhadores para as lutas mais gerais e a facilidade de mobilizar para as lutas econômicas. Outro grave problema, inclusive do ponto de vista de gênero, é que às mulheres no sindical têm dificuldade de fazer uma greve sobre direitos de recorte de gênero.

Continuando, Julio afirmou que o movimento negro não tem tratado a luta do ponto de vista mais geral e, fora isto, existe uma crise no movimento sindical brasileiro. Sindicalistas, quando entram no movimento sindical, ficam vários mandatos e quase se aposentam como sindicalistas e isto compromete a luta mais geral.

Continuando, ainda, afirmou que existem problemas também com o movimento negro. Concordou que às vezes é preciso passar com o “pires na mão”, mas no geral a parceria é positiva. E exemplificou que, em Salvador, as lutas do movimento negro são construídas na parceira com o sindical. Julio argumentou que os movimentos sociais, em geral, não possuem os recursos orçamentários que os sindicatos possuem para construir ações. O recorte do movimento negro contemporâneo se deu de 1979 pra cá, sendo muito recente. Sobre ações conjuntas, lembrou que as duas marchas: ZUMBI e ZUMBI +10 foram construídas pelo movimento negro em parceria com os sindicatos. Quanto ao CONEG, apesar de termos uma construção em parceria, temos as limitações da Coordenação Nacional para chegar nas entidades e divulgar melhor o Congresso.

Sobre o ENEN e o CONEN, o movimento sindical, mesmo não fazendo parte da Coordenação, foi uma grande aliada na construção do ENEN e o CONEN.

Finalizando, argumento que na UNEGRO existe um entendimento que as bandeiras do movimento sindical são as mesmas do movimento negro. Que o negro que está no chão de fábrica, muitas vezes não é do movimento sindical e é do movimento negro. Como também pode não ser militante de nenhum dos dois setores. Afirmou que o movimento negro não consegue se unificar internamente em torno de lutas como o movimento sindical está construindo e que o MNU tentou construir este papel de unificação e não conseguiu e agora todos esperam que o CONEB possa construir esta relação.

Findas as falas dos debatedores, a Mesa abriu inscrições para intervenções do Plenário.

Aberto o debate sobre o tema, várias intervenções abordaram a relação entre movimento negro e movimento sindical. A maioria reconhece dificuldades para construções de ações mais aprofundadas no dia a dia, mas reconhece a existência de uma relação de aliança entre os dois movimentos, indo mais além. O militante é negro, antes de ser sindicalista; isto quer dizer que militância dele no sindical sempre será de um militante negro que faz a luta de classe. O enfoque da parceria ativa dos sindicatos é visualizado nas ações que o movimento negro tem construído, em sua maioria com ajuda dos sindicatos e com a construção e participação de militantes negros e sindicalistas. Também foi abordada, a necessidade do movimento sindical agregar outros setores na luta pela construção da igualdade racial, que é preciso que o movimento negro seja respeitado e que as pastas de políticas sociais que são criadas nos sindicatos evoluam para um recorte de gênero e etnia.

O CNCDR tem feito a sua parte na construção do combate ao racismo e o faz a partir do movimento sindical. As contradições do MNU sobre políticas compensatórias como as cotas, que cumpre o papel de instituir oportunidades para a promoção da igualdade racial bem como qual seria a posição do MNU sobre Estatuto da Igualdade Racial foram abordadas em varias intervenções.

Outra abordagem expressou que os temas debatidos no sindical também incorporam a questão dos negros. Quando se faz a discussão do SUS também está se fazendo a discussão da saúde da população negra; quando se fala de assédio moral, os negros são os mais assediados; a discussão de saúde do trabalhador também engloba a discussão da saúde do trabalhador negro que tem suas especificidades. Que não é necessário nem interessante fazer a discussão separada. É preciso fazer a discussão coletiva e dar a ela o recorte do negro.

Sobre DURBAM, uma reflexão de que a mesma não é em si, a resolução de todos os problemas, que tem suas vitórias e tem seus retrocessos. Que DURBAM negou a reparação dos povos africanos.

Outra reflexão importante do debate foi de que é preciso superar o racismo para avançar no corte de classe das lutas sociais, e que a FASUBRA faz bem isto quando constrói o olhar negro da Educação no projeto Educação Universidade Cidadã. A FASUBRA deve continuar avançando com novas contribuições para ampliar a consciência dos militantes para a existência deste enfoque racial necessário.

Sobre cotas, foi abordado que nunca houve unanimidade sobre o processo de cotas dentro do movimento negro. Que quando a FASUBRA, dentro do movimento da educação, colocou o seu olhar negro sobre a educação, foi por entender a educação como instrumento de superação das desigualdades. Que o sindical tem que estar por dentro do movimento negro para que se possa transformar a sociedade com o olhar da igualdade. Que isto serve também para nós negros, que fomos criados numa sociedade racista e preconceituosa e que nós negros devemos encaminhar em nossas bases, as propostas que a Federação construir para ampliar a luta contra a discriminação racial e pela promoção da igualdade.

Após as intervenções do plenário, os debatedores fizeram suas ponderações sobre estas e posições colocadas por outros debatedores.

Marcos Benedito (CNCDR/CUT) – afirmou ter localizado no tema um questionamento importante e argumentou que a CNCDR está construindo o dia 20 de novembro junto com as entidades do movimento negro, dando todo o apoio político e organizativo da mesma forma que no ano passado. Que a CNCDR está formulando políticas para a sua coordenação encaminhar. Que o CONEG é importante e que se considera um militante do movimento negro, por dentro do sindicato. Isto não significa que tenha total poder de convencimento dos outros militantes sindicalistas. Continuando, afirmou que existem entidades do movimento negro que não consideram a CNCDR como movimento negro, o que é ruim. Informou que A CNCDR está com 70 entidades na sua Coordenação Política e a executiva tem 15, para melhorar os encaminhamentos. Que o movimento sindical negro tem que se apropriar do CONEG e colocar para discutir o trabalho para o negro neste Congresso.

Sobre a religiosidade e a intolerância religiosa, Benedito disse que sua forma de luta não é conflitante com a sua religião. Que a intolerância religiosa é praticada por um setor bem específico entre os evangélicos, que é a IURD . Entende que a religiosidade não deve ser algo que nos separe e, sim, algo a ser respeitado entre os negros praticantes e os não praticantes das religiões de matrizes africanas.
Sobre DURBAN, Benedito disse que DURBAN não acabou porque Israel e os Estados Unidos saíram, e que o movimento negro está trabalhando para que as políticas construídas sejam implementadas, porque quando nós, do movimento negro, nos pronunciamos contra DURBAN, estamos sendo contra a origem de todas as políticas de reparação. Afirmou que existem pessoas fundamentais para a construção do movimento negro e que, na FASUBRA, estão várias delas.

Jacira (MNU) – perguntou para a Federação o que esperava desta Mesa de debates. Argumentou que o fato de não saber o recorte engessou os participantes. Afirmou que é preciso extrair do debate o que pode sair como política e o que pode sair como ação. Que o adversário – se existe – não está entre nós e que divergências existem pra garantir a democracia.
Afirmou que ser negro é questão de identidade. Temos que afirmar quem somos para termos a autoridade de transitar em todos os espaços. Pensar que o movimento negro tem só 25 anos é um absurdo. É preciso saber qual padrão teremos que seguir para não romper com a nossa identidade de descendentes de africanos, a naturalidade, a forma espontânea de ser, etc. O tempo fez com que se refletisse em nós o que já vivenciamos: somos negra, mulher, sindicalistas, isto é o que somos.Somos tudo isto e a cada momento uma delas aflora.
Argumentou que é uma violência ter que sermos melhores porque somos negros. Que a questão racial passa pelos direitos humanos e que a luta de Martin Luter King hoje é reconhecida e antes não era sequer compreendida.

Finalizando, disse que temos que sair da armadilha de sempre termos que ser contra ou não ser contra alguma coisa, de forma cristalizada.Que estamos nos dando a liberdade de não sermos centralizados.

No recorte de gênero, por dentro da luta racial, Jacira disse que muitos de nós mal saímos da casca do ovo, mas é importante dizer que temos respeito entre nós. Para discutir as questões mais amplas de gênero devemos refletir sobre a nossa conduta. Como discutir a questão dos travestis, quando dividimos o debate sempre entre homens e mulheres no recorte de gênero? O viés de gênero na discussão racial amplia a discussão quanto às políticas que devemos ter para a construção de promoção da igualdade racial. Lembrou que o MNU teve o primeiro grupo de gays negros que foi o protagonista na discussão de inclusão pelas diferenças. Afirmou que Lula foi o primeiro presidente a dizer da dificuldade enfrentada e, ao colocar o chapéu do movimento negro e defender suas bandeiras, sabia da dificuldade que existiria ao fazê-lo. Mas tomou a decisão de fazer acontecer as reivindicações do movimento.

Sobre a religiosidade, afirmou ser outra polêmica. Argumentou que, na Constituição Federal, todos temos direitos de liberdade de expressão e de crença, mas, no dia a dia, é bem diferente. Tivemos vários olhares diante de nós negros e das nossas heranças culturais; a partir do fato que incomodamos significa que existimos também. Então não se pode esperar que os negros participem de uma herança religiosa da história de colonização que oprime, exclui e separa. Afirmou que a espiritualidade não separa ninguém. O que separa as pessoas são as próprias pessoas e o que nos divide não é o preceito. Quantos estão por dentro de religiões de matrizes não africanas, mas estão se organizando, o que é muito bom.

Na questão da educação, importante se faz a discussão da implantação da lei 10.639, que inclui nas grades curriculares a história da África. E sobre a questão Quilombola, disse que terra é um direito de todos. Sobre DURBAM, lembrou que em DURBAM a maioria da delegação era de mulheres negras, o que mostra o avanço das mulheres na construção do movimento negro. Afirmou que no sindicato nos espaços de poder, ainda somos minoria.

Lembrou que é importante formar cada vez mais negros e negras e ampliar o acesso à formação em todos os níveis, mas que é importante termos intervenção de qualidade, engajada na historia de luta do povo negro, porque uma só intervenção de qualidade já ajuda muito para garantir que não nos intimidem nos espaços de poder acadêmico e social. Na construção da retaguarda da luta pela promoção da igualdade e do combate ao racismo, precisamos brigar dentro dos sindicatos para implantar as ações que discutimos e aprovamos. Finalizando, disse que unidade não é pensar igual, é estar igual e estar juntos na luta.

Julio (UNEGRO) – refletiu que o movimento negro deu um salto de qualidade quando compreendeu que a luta também é de classe. E o movimento sindical, talvez não todo, compreende que a luta de classe tem que ser superada na questão do recorte étnico-racial. Para conquistar uma nova sociedade é preciso erradicar o racismo no Brasil. Em 2010, a maioria absoluta do povo brasileiro será de negros e negras.A luta racial e a de classe estão interligadas. Estes mecanismos estão construídos. A CNCDR é fruto disto, e o próprio encontro da FASUBRA também. O movimento negro também constrói estes mecanismos, a Marcha Zumbi + 5 e Marcha Zumbi +10, os CONEG’s, etc. A discussão da lei 10.639 é uma vitória do movimento negro. Quando o movimento sindical da educação debate a lei, eles convidam os formuladores do movimento negro.

Por fim, colocou que, na ação, você é parceiro, no dia a dia, você é aliado. É preciso criar mecanismos, alguns estão colocados em prática, outros serão criados no decorrer da luta.

Disse que o movimento negro tem que fazer uma reflexão sobre não conseguir construir nos estados brasileiros a unidade para construir a parceira nas lutas. É preciso lembrar que a unidade que não pode ser feita por cima e sim, na ponta. Que a FASUBRA é uma das federações que tem discutido muito estas questões raciais e que outro setor que tem feito isto é o dos Correios.
Afirmou que somos quase 100 milhões de negros, a grande maioria dos desempregados. O desemprego tem cor. A maioria das mulheres negras está numa condição social muito diferente, inferior que a dos homens negros e das mulheres brancas. Finalizou, dizendo que CONEG é um rico momento de debate político do movimento negro.

12h30 às 14h30m: Intervalo para almoço

14h00: Estratégias de implementação das Cotas (acesso e permanência) nas Universidades Brasileiras

Debatedores: João Paulo (FASUBRA), Luiz Henrique Schuch (ANDES) e Bárbara Rosa (MEC)
Moderadora: Niversina Soares
Relatora: Graça Freire

João Paulo (FASUBRA) – iniciou sua fala ressaltando que as nossas estratégias foram sendo construídas nos nossos fóruns (Congressos, Seminários, Encontros). Continuando, falou que nossos militantes atuam nos diversos fóruns do movimento negro e o que tiramos destes fóruns, levamos para dentro da FASUBRA.

Enfatizou que, como produção, nós temos nosso Projeto de Universidade Cidadã para os Trabalhadores e o de CARREIRA, que contêm implicitamente ações estratégicas para a implementação da Política. Achamos que são importantes estas ações para superar o racismo no país. Os nossos militantes se capacitam e assim a FASUBRA se faz presente através desses militantes. A FASUBRA se sente representada pelas suas Entidades de Base e através de seus militantes.

Acrescentou, ainda, que importantes experiências são referências para o movimento, como por exemplo: a do Paraná, com as cotas geográficas e a da UNB. Nós não temos outras propostas que não as contidas nos nossos projetos e defendidas pelos nossos militantes de Base.

Schuch (ANDES) – começou sua intervenção enfatizando que o tema sobre universalização do acesso e a luta contra os instrumentos que acirram as desigualdades sociais fazem parte de nossa preocupação nos fóruns do ANDES. Resumidamente, uma síntese que temos sobre o tema mais geral: democratização do acesso e permanência nas universidades brasileiras.

Quanto à questão das cotas, da igualdade, colocou que há uma separação de classe que tem cor e tem raça – onde se acham os excluídos. Que é preciso que se estabeleçam alavancas de recuperação desses setores multiplicadamente atingidos. Resume-se aí a nossa luta: a inclusão no ensino. E as cotas precisam ser encaixadas a partir de dados históricos. Universalizar o acesso, com igualdade e compromisso social – ampliação de investimentos para o ensino superior público. E para reduzir o déficit histórico em relação à educação no Brasil, considerando o PIB, precisaríamos de vários anos. O que vemos na prática é uma redução no investimento público.

Colocou, ainda, que é preciso abolir o caráter classificatório do vestibular para democratizar o acesso, que é um direito de todos. Não podemos vacilar na luta contra as perspectivas de ações excludentes. Acenamos com a possibilidade de extinguir o vestibular, visando um acesso não discriminatório, não classificatório. Mas, queremos o acesso com garantia da qualidade do ensino. Queremos lutar, com o conjunto das outras entidades, pelas políticas de permanência, com compensações de moradia, acesso à internet, alimentação. Continuar a luta a luta pelas políticas de ações afirmativas e contra as opressões e desigualdades sociais que envolvam qualquer tipo de discriminação: raça, etnia, gênero, classe social. Nas relações de poder, nas relações nacionais e internacionais, é fundamental que as entidades interfiram contra a discriminação e pela inclusão. Daí a defesa da extinção de vestibulares com caráter classificatório.

Ressaltou que as políticas públicas precisam ser permanentes e estruturantes para transformar essa situação discriminatória. Políticas de ações focais 1- territórios de menor renda per capta, menos equipamentos, no sentido de corrigir os ensinos básico e fundamental; 2 – atuar nos núcleos quilombolas, construindo políticas, respeitando essas áreas, para derrubar as ações discriminatórias. Como estratégias do ANDES – políticas afirmativas colocou que estas devem estar alicerçadas na qualidade e no compromisso social, atendendo principalmente as áreas mais discriminadas. As Universidades e os CEFETs devem garantir acesso dos alunos oriundos dessas áreas e de quilombolas para democratizar o ensino. A meta deve ser a extinção progressiva do vestibular.

Bárbara (MEC) – começou falando que, quando se fala em Políticas Afirmativas, a gente se remete a um passado de exclusão. Remete à década de 40, quando começa a luta para que o negro se insira no sistema educacional brasileiro. Temos todo um processo de exclusão desde o acesso à educação infantil até a universidade, cujo número vai cada vez se tornando menor. Para que hoje sejam aplicada as PAs nas escolas, é preciso que haja um acesso maior, menor taxa da evasão desde o início, para termos crescimento do acesso aos negros na universidade. As políticas devem ser estruturantes e só se consegue garantir a implementação dessas políticas quando a gente assegurar que a educação é para todos.

Ressaltou que nós não podemos pensar só em políticas de acesso que garanta a inclusão social através das cotas, mas, temos que associá-las ao sistema de permanência, que vai garantir a presença quantitativa e qualitativa dos alunos na escola e na universidade. Bolsas de permanência para extensão, só com recorte social. O intento agora é criar um recorte voltado para a permanência para que o estudante negro e o carente permaneçam na universidade. Em 2006, conseguimos garantir que 16 universidades fossem contempladas com recursos para iniciação científica e bolsas de permanência. Essas ações não têm caráter de ações afirmativas. O déficit para nós é a nossa principal carência.

Enfatizou que a FASUBRA tem um papel importante de fomentar esta discussão de políticas de permanência dos alunos nas Universidades. Não basta pensar nas políticas de ingresso, através de cotas. Muitas das vezes os alunos não têm como chegar nas universidades, nem como manter-se nelas. Precisamos pensar em políticas de ações afirmativas com corte na permanência. Tivemos algumas iniciativas neste sentido, como o PICs, mas o MEC avalia que não tem o quantitativo real dos alunos ligados a esses programas.
Informou que o MEC está estudando projetos que favoreçam o acesso e a permanência de alunos na universidade, mas, avalia que é importante primeiro caminhar no sentido de promover a educação básica com qualidade. Temos muitos alunos que saem dos ensinos médio e fundamental sem saber ler. Precisamos não só promover uma política estruturante de acesso, mas promover condições de permanência, dadas as condições sociais dos jovens oriundos de áreas carentes. O desafio é também atentar para a educação lá na ponta.

Niversina (FASUBRA) – começou sua fala lembrando os vários militantes da FASUBRA, ao longo desses anos. Iniciou falando de sua experiência na área da saúde que tem relação com as carências sociais, porque muitos jovens não tiveram uma política de assistência e de atendimento. A maioria, negros, que estão nas drogas. A falta de políticas afirmativas leva hoje ao que vemos de violência repassada pela TV. Nós somos uma sociedade que pagamos um preço muito alto pela falta de políticas afirmativas. Estas devem traduzir, na educação, desde o nascer, perpassando pela infância e adolescência e chegando nas mãos do professor já imbuídos das experiências negativas expostas pela TV.

Colocou que, como na educação, também na saúde temos que ter uma visão do olhar negro. Também no trabalho as mulheres negras têm que ter o mesmo direito das mulheres brancas. Com relação aos jovens, o maior número de desempregados são negros. Lembrou a visão distorcida sobre a questão racial oferecida pela televisão como é o caso da novela das 8 que mostra um deputado corrupto negro.
Lembrou que tantos são os direitos negados à população negra – direito à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer. Precisamos pensar em estratégias que implementam a luta em favor das políticas afirmativas. Precisamos construir ações conjuntas, independentes de grupos políticos. Temos que romper com as desigualdades. Temos que ser corajosos e romper com nossa cultura.

Segundo ela, nós, da saúde, sabemos que para curar uma ferida tem que fazer sangrar. Os sofridos só querem amar e ser amados. Só querem um útero e a FASUBRA pode ser esse útero de transformação da sociedade. Absorvendo esta reflexão, se termos o olhar positivo, independente de grupos, nós, da FASUBRA, vamos implementar todas aquelas coisas boas que forem propostas neste Encontro.

Findas as falas dos debatedores, a Mesa abriu inscrições para intervenções do Plenário.

Retornada a palavra à Mesa, foi reiniciado o debate com a observação de que após seus pronunciamentos os debatedores deveriam tecer as considerações finais:

Schuch (ANDES) – procurando responder a alguns questionamentos do Plenário, iniciou, afirmando que o ANDES será parceiro para discutir cotas associadas ao mercado. É bem verdade que a maioria dos processos de votação de cotas perde nas universidades porque os docentes são maioria nos colegiados. Mas é bem verdade que há também debates em que os técnicos superam os docentes.
Ressaltou que não podemos trabalhar no conceito liberal da igualdade. A nossa intervenção revolucionária não é assim, mas vamos enfrentar o debate das reparações.

Colocou que, naquele momento, não iria fazer o debate sobre o PROUNI e o REUNI. A nossa tarefa é muito difícil – temos noção de que se trata de um embate de projetos que têm coerência entre si, mas temos a consciência que estamos numa sociedade capitalista. A cultura retrata o estrato social empapado na universidade – o novo doutor, a minha sala, o meu laboratório.

Finalizando, enfatizou que não temos objetivos distintos e nos consideramos aliados na construção da transformação da sociedade. E saímos animadíssimos daqui.

João Paulo (FASUBRA) – fez leitura do art.25 e seus incisos do Projeto de Universidade Cidadã para os Trabalhadores. O que fazer para implementar nossas idéias? Citou Zeca Pagodinho: “Eu não sou hipócrita de participar de movimento pela paz enquanto tivermos crianças negras nas ruas”.

Sobre o REUNI, esclareceu que a FASUBRA tem posição congressual não contrária, mas sim com restrições ao projeto por entender que há pontos que precisam ser mais debatidos.

Bárbara (MEC) – na mesma linha do representante do ANDES, procurou responder a alguns questionamentos feitos pelo Plenário. Colocou que o MEC não tem ingerência na autonomia das universidades. Não interfere na taxação de vestibular nas universidades, até porque também não acredita no vestibular como ferramenta de avaliação para classificar alguém a uma vaga na universidade.

Fez referência ao projeto de distribuição de kits para formação de professores da rede pública, visando melhorar a qualidade desse nível de ensino.

A respeito do papel do gestor e do gestor negro dentro do MEC, falou que se a gente for pensar no número destes gestores é ínfimo. E se for pensar em gestores que têm comprometimento com essas políticas afirmativas, o número é quase zero. É muito difícil falar de extensão e expansão de cursos com qualidade. O Importante muitas das vezes é a quantidade – aumento de cursos noturnos.

Questionada sobre a situação da população de rua, afirmou que nós não temos debate sobre esta área dentro do MEC. Temos registro daqueles que estão na educação básica, mas sobre os que estão na rua e fora da escola, não temos. É um debate que precisa ser feito. Como a FASUBRA e o ANDES podem fazer este debate sobre a inserção do gestor negro no poder decisório?

Concluindo, a representante do MEC ratificou a fala do JP com relação ao REUNI e ao PROUNI por entender que os pontos polêmicos dos projetos precisam ser mais bem debatidos e não rejeitados.

Afirmou que concorda com o desafio de trabalhar com a FASUBRA nas ações estratégicas que forem tiradas neste Encontro. Nós precisamos de gestores negros e “não negros”, comprometidos com a implementação das políticas afirmativas para os negros.
Niversina (FASUBRA) – saudou a todos e agradeceu a presença dos convidados participantes (Shuch e Bárbara), que estavam se retirando antes do encerramento dos trabalhos da Mesa, em virtude de outros compromissos assumidos naquele horário.

Continuando, apresentou alguns questionamentos: Quantas vezes não assumimos nossa condição de cotistas? Quantas vezes negamos nossas origens?

Lembrou que para aqueles que se assumem e entram na universidade são muitas as dificuldades que o sistema lhes impõe. Hoje, a universidade é um berço da doença e da falta de qualidade de vida. Muitos alunos são alojados em verdadeiras favelas – é lá que ficam os cotistas.

Finalizando, enfatizou que precisamos concretamente construir ações – formas de sentar com ANDES. Precisamos por a mão na massa e implementar nosso projeto onde a gente mora e no nosso dia a dia.

19h00: Atividades Culturais – Confraternização na Praça “Chico Mendes”, na Unb.

DIA 21/06/2008

09h00: Grupos de Trabalho – Socialização e intercâmbio entre os Sindicatos de Base para subsidiar as “Táticas e Ações da FASUBRA Sindical no combate a Discriminação na IES”

Os participantes foram distribuídos em 3 Grupos de Trabalho. Foi dado o limite até 12h para conclusão dos trabalhos e marcado o retorno para 14h.

13h00: Reunião da Comissão Organizadora – sistematização dos Relatórios a serem apresentados na Plenária Final.

12h30m às 14h30: Intervalo para Almoço.

14h00: Plenária Final

Encaminhamentos do Encontro – Apresentação dos Relatórios dos 3 Grupos de Trabalho
Coordenação da Mesa: Nara Costa, Yone Gonzaga e Noelma Santos.
Relatora: Graça Freire

A Coordenação foi chamando a representação de cada Grupo de Trabalho para apresentar seu Relatório. Foi colocado que, na medida em que fossem sendo apresentados os relatórios, os participantes poderiam pedir destaques nos itens que necessitarem de maior debate para posterior deliberação.

Levantados os destaques, foram sendo lidos e postos em discussão. Em razão de muitos destaques serem mais de redação e de pedidos de esclarecimentos, a Coordenação da Mesa propôs a suspensão dos trabalhos da Plenária por 10 minutos e a constituição de uma Comissão para construir propostas de textos com redação de consenso no que se refere aos itens mais destacados. Para desenvolver esta tarefa, foram indicadas: Jupiara, Niversina, Rosângela e Loiva em razão de terem sido as pessoas que mais solicitaram destaque nos pontos em referência.

Findo este tempo, a Coordenação retomou os trabalhos e apresentou o resultado do esforço de construção de texto da Comissão. Como a FASUBRA já tem propostas sobre acesso e permanência, inclusive já estão incluídas no Projeto de Universidade Cidadã para os Trabalhadores para muitas propostas apresentadas, a Coordenação da Mesa apontou que deveria prevalecer nos textos a forma como está redigida no Projeto, o que teve acordo e todos os participantes.Sobre os outros destaques ligados à construção do Calendário de Reuniões, realização do Censo sobre os Trabalhadores Técnico-Administrativos em Educação das IFEs e resgate da história dos negros no Projeto Memória da FASUBRA, o debate foi mantido.

FINDO ESTE ESPAÇO DE DEBATE, FORAM APROVADAS PELA PLENÁRIA AS SEGUINTES PROPOSTAS:

1. GRUPOS TÉCNICOS – GTS (FASUBRA E ENTIDADES DE BASE)
a) a FASUBRA deve indicar aos sindicatos de base mobilização para as pautas emergenciais, como o PL 73/00 (Estatuto da Igualdade Racial);
b) a FASUBRA deve orientar a formação de GTs, onde ainda não exista, acompanhando os já existentes;
2. AÇÃO JUNTO À SEPPIR, AO GOVERNO, NO CONGRESSO NACIONAL E OUTROS FORUNS
a) FASUBRA deve reivindicar à SEPPIR participação em seus fóruns em seus espaços de discussão para contribuir na construção da política étnico-racial;
b) FASUBRA deve fazer gestão junto ao governo no sentido de obter agilidade nas pautas apresentadas;
c) FASUBRA deve cobrar do congresso nacional a aprovação das leis, do Estatuto da Igualdade Racial e de todas as políticas públicas que garantam a igualdade;
d) FASUBRA e suas entidades de base devem cobrar dos parlamentares a aprovação da data de 20 de Novembro como feriado nacional;
e) FASUBRA e suas entidades de base devem participar de todos os espaços democráticos de discussão étnico-racial;
3. PROJETO UNIVERSIDADE CIDADÃ PARA OS TRABALHADORES – Acesso e Permanência
a) FASUBRA deve investir na concretização das propostas contidas no Projeto de Universidade Cidadã para os Trabalhadores, relativas às políticas de ações afirmativas, como segue:
– lutar pela aprovação de políticas que assegurem condições de acesso e permanência dos alunos negros, garantindo a igualdade de tratamento entre iguais e a justa e devida diferença entre os desiguais;
– promover uma campanha nacional, articulada com outras entidades do movimento negro, visando por fim a todos os preconceitos raciais, de gênero, sociais e relativos às opções políticas, religiosas e de orientação sexual;
– lutar para que seja adotado critério de acesso dos alunos aos cursos oferecidos pelas universidades, sem caráter eliminatório;
– lutar pela aplicação, em todas as universidades, de políticas reparatórias e compensatórias, através de ações afirmativas, com a adoção de cotas étnicas, raciais e sociais;
– propor a criação, em todas as universidades, de uma Comissão de Permanência composta pela administração e pelos 3 segmentos da comunidade universitária (TAEs, Docentes e Alunos) com o objetivo de estabelecer política e acompanhar as ações de permanência dos alunos;
b) FASUBRA procure envolver os outros dois segmentos (Docentes e Alunos) nestas lutas;
c) que a FASUBRA indique para todos os sindicatos de base o estudo do Projeto Universidade Cidadã para os Trabalhadores;
4. FORMAÇÃO
a) FASUBRA deve promover Formação de Nivelamento para a Direção Nacional da Federação e suas entidades de base, com temas como: Raça e Classe – Afro-descendência;
b) FASUBRA deve buscar organizar seminários em conjunto com entidades como: ANDES, UNE, SINASEFE, Movimento sem Educação, de acordo com as deliberações congressuais;
c) FASUBRA deve propor a inclusão da pluralidade étnico-racial nos currículos escolares, a partir da educação infantil;
d) FASUBRA deve indicar o debate sobre a criação da Coordenação de Negros e Negras e de Mulheres para aprovação no próximo CONFASUBRA;
5. PROJETO MEMÓRIA DA FASUBRA
a) que conste do Projeto Memória da FASUBRA o resgate da história dos negros – material e pessoas;
6. REVISTA COMEMORATIVA DOS 30 ANOS DA FASUBRA
a) que seja editada e publicada uma Revista Comemorativa dos 30 anos da FASUBRA com o Tema;
7. CENSO
a) realizar um censo envolvendo Entidades do Serviço Público – Ministério do Planejamento;
8. CONVENÇÕES 100 E 111
a) disponibilizar as Convenções 100 (mulheres) e 111 (discriminação no mercado de trabalho) no site da FASUBRA;
b) lutar pela implementação das Convenções 100 e 111;
c) que a FASUBRA e suas entidades de base coloquem cláusulas anti-racismo nos Acordos Coletivos e nos Dissídios, com base nas Convenções 100 e 111;
9. CALENDÁRIO
a) Que sejam realizadas reuniões bimestrais do GT-FASUBRA;
b) Que seja incluída a discussão étnico-racial nos próximos Encontros Regionais;
c) Que no próximo CONFASUBRA haja uma Mesa sobre a discussão étnico-racial;

18h00: Ato de Encerramento

Mesa de Encerramento: Luizão e Rolando (Coordenadores de Políticas Sociais e Anti-Racismo)
Relatora: Graça Freire

Fala final dos Coordenadores de Políticas Sócias e Anti-Racismo – Luizão e Rolando

O Coordenador Luizão fez uma fala de agradecimento a todos, ressaltando a importância do Encontro e a grande contribuição dada pelos companheiros que constituíram a Comissão Organizadora do mesmo: Nara, Cosme, Noelma e Yone.

O Coordenador Rolando ressaltou a responsabilidade da Coordenação e a postura que é tomada pelos seus titulares de forma supra partidário e supra coletivo. A cor da camisa é a da FASUBRA. Agradeceu a contribuição das companheiras do Plantão e ao Coordenador Geral, João Paulo, que se esforçaram para colaborar na organização do evento.

As Coordenadoras da Mesa: Noelma, Nara, Yone resumidamente falaram sobre seus sentimentos positivos em relação ao Encontro e agradeceram a participação de todos.

Ao final, foi proclamada uma Poesia, pela companheira Marina (SINDIFES-BH), cujo texto segue, transcrito:

BALA PERDIDA

OLHOS FITOS NO TETO DE ZINCO.
O GALO DESPERTOU CINCO HORAS NO BECO.
OUÇO PASSOS DESCENDO A LADEIRA
EM MOVIMENTO CURVILÍNEO ACELERADO.
ALGUÉM TEM PRESSA PARA ALCANÇAR O SOPÉ DO MORRO
E TOMAR O LOTAÇÃO DAS SEIS.
É ZÉ PRETO QUE VIROU CRENTE, CONVERTEU,
ARRANJOU EMPREGO DE DIA,
E VAGA NA UNIVERSIDADE PÚBLICA À NOITE,
ENGRAXOU AS BOTINAS.
VESTIU-SE FEITO GENTE FINA
E DESCE ASSOVIANDO UM RAP, UMA CANÇAO GOSPEL, SEI LÁ!
RETIRO OS OLHOS DO TETO DE ZINCO
E O PROJETO MORRO ABAIXO
ATRAVÉS DA JANELA MIÚDA DO MEU BARRACO.
DESEJO VER ZÉ PRETO
PARTINDO EM BUSCA DO HAPPY END DE SUA HISTÒRIA
E LÁ ESTÁ ELE, ESTICADO NO CHÃO, EM DECÚBITO DORSAL.
ZÉ PRETO MORREU.
NÃO ALCANÇOU O SOPÉ DO MORRO.
A DOIS TERÇOS DO CAMINHO
UMA BALA PERDIDA O ALCANÇOU
E SUAS BOTINAS, IMPECAVELMENTE ENGRAXADAS,
APONTAM AGORA PARA O CÉU.
E EU PERGUNTO, COMPANHEIROS:
– QUEM É ZÉ PRETO?
SERÁ NOSSO FILHO, NOSSO VIZINHO,
NOSSO AMIGO OU COLEGA DE TRABALHO?…
OU SEREI EU MESMO
QUE PERMITO A UMA SOCIEDADE EXCLUDENTE
IMPOR-ME CONDIÇÕES SUB-HUMANAS?
E O QUE SERÁ ESSA BALA PERDIDA?
SERÁ O TRÁFICO, O SISTEMA
OU SEREI EU MESMO QUE ME FECHO NA OMISSÃO?
MEU DESEJO, COMPANHEIROS,
É ALTERAR MEU VERSO
E MUDAR O DESTINO DE ZÉ PRETO
DANDO A ELE O HAPPY END,
O FINAL FELIZ QUE ELE MERECE.
E VOCÊ?

18h30m: Entrega dos Certificados e encerramento dos trabalhos.

Fonte: Fasubra Sindical