Sessão histórica do STJ permite adoção por casal gay

Decisão unânime cria precedente para que casais homossexuais adotem filhos em conjunto Luciana Reis Maidana, mãe, ao lado de outra mulher, de dois meninos adotivos

Um casal homossexual de Bagé obteve ontem no Superior Tribunal de Justiça (STJ) uma vitória que muda a história do direito de família no Brasil. A psicóloga Luciana Reis Maidana, 36 anos, e a fisioterapeuta Lídia Brignol Guterres, 44 anos, tiveram confirmado o direito de compartilhar a adoção de dois meninos, de seis e sete anos. A decisão, unânime, cria precedente para que outros casais gays adotem filhos em conjunto.

É a primeira vez que um tribunal superior reconhece o direito. Até agora, os casais homossexuais driblavam a legislação, aproveitando a brecha que permite a solteiros adotar. Adotavam juntos, mas apenas um dos companheiros aparecia nos registros como pai ou mãe. Foi o que aconteceu com as lésbicas de Bagé. Juntas há 13 anos, elas adotaram um menino em 2002 e outro em 2003. Na certidão de nascimento, ambos, hoje com seis e sete anos, apareciam apenas como filhos de Luciana. Com a decisão do STJ, passa a ser oficialmente reconhecido que os meninos têm duas mães.

Os próprios ministros do STJ reconheceram como inovadora a sua decisão. O parecer deles foi de que deve prevalecer o interesse da criança.

– Esse julgamento é muito importante para dar dignidade ao ser humano, para o casal e para as crianças. Se não for dada a adoção, as crianças não terão direito a plano de saúde, herança e em caso de separação ou morte podem ficar desamparadas – disse o relator, Luis Felipe Salomão.

O caso tramitava desde 2005, quando a Vara de Infância e Juventude de Bagé permitiu a Luciana e Lídia o registro dos meninos. O Ministério Público Estadual recorreu. Na época, o promotor da cidade André Barbosa de Borba justificou afirmando que a adoção conjunta só seria permitida em caso de casamento ou união estável. Ele afirmava que, como não havia lei regulamentando a união entre pessoas do mesmo sexo, a adoção seria irregular. Em 2006, Luciana e Lídia obtiveram nova vitória, no Tribunal de Justiça do Estado, que reconheceu a entidade familiar. O MP, porém, voltou a recorrer, o que levou o caso para Brasília.

O ministro Luis Felipe Salomão explicou ontem que o laudo da assistência social recomendou a adoção, assim como parecer do Ministério Público Federal. A expectativa é de que a decisão do STJ abra caminho para uma legislação que reconheça o direito de adoção por homossexuais.

– Não estamos legislando. A lei sempre veio a posteriori – disse o presidente da quarta turma do STJ, ministro João Otávio de Noronha.

Luciane e Lídia não são o único casal homossexual a obter o direito a adoção na Justiça, mas são o primeiro a obter sentença favorável em um tribunal superior. A defensora pública Patrícia Aléssio, que defende Luciane e Lídia desde o início, observa que outros casos não chegaram a Brasília porque, em geral, promotores e procuradores do MP têm concordado com as decisões dos tribunais – o que não ocorreu no caso de Bagé.

Por que é importante
– Ela cria precedente para pedidos de adoção semelhantes.
– A lei permite que uma pessoa solteira adote. É por esse caminho que homossexuais podem obter o direito. Mas a criança fica registrada como filha de apenas um dos integrantes do casal. Em caso de morte ou separação do adotante oficial, acaba desamparada.
– Com a adoção conjunta, a criança não volta a ser considerada órfã em caso de morte do adotante principal. Também tem garantia de direitos como pensão em caso de separação ou herança.

O recurso do MP

– O MP argumenta que, pela legislação, pode adotar em conjunto só quem é casado ou vive em união estável. Segundo os promotores, uma união entre duas mulheres não configura entidade familiar.

O argumento do STJ

– O ministro Noronha observou que a adoção por um casal gay não é proibida por lei.
– Segundo ele, nenhum dispositivo legal foi violado, porque o Código Civil não veda a adoção e não há nenhuma norma proibindo a adoção por casais homossexuais.

fonte Zero Hora