Fasubra convoca as entidades dos servidores para Ato contra o PLP 92/07 que cria as Fundações Públicas de Direito Privado

A Fasubra convocou as entidades de base para mobilização “Contra o Projeto de Lei Presidencial 92/07, que cria as Fundações Estatais de Direito Privado". A Assufrgs envia 10 servidores para o Ato em Brasília, na quarta-feira (17/6). “O momento exige um grande esforço contra este Projeto”. Na avaliação das entidades sindicais este projeto trará danos para o SUS, com a precarização das relações de trabalho, com o fim dos concursos e da carreira, permitindo demissões de cunho político e à terceirização dos profissionais de saúde, tornando o atendimento à população mais precário. 
O deputado Ivan Valente (PSOL) em entrevista ao site Correio da Cidadania vai mais longe e diz que o projeto trata da privatização de serviços essenciais.

Leia a entrevista do Deputado Ivan Valente (Psol) ao Correio da Cidadania

Mais uma vez, o país se depara com um projeto de lei de claro
caráter privatista, com o enfraquecimento do Estado em suas áreas de
atuação essencial. No caso, o projeto de Lei Complementar 92, que
tramita na Câmara, com o apoio dos próprios quadros governamentais.
Prova emblemática de seus perigos é a confluência com os partidos
de oposição de direita na aprovação do projeto.

Com vistas a analisar mais essa proposta de desmonte do Estado, que
de uma tacada só abriria a porteira para as fundações estatais de
direito privado em todas as áreas de importância social – de
educação e saúde, passando pela cultura, ciência e tecnologia -, o
Correio da Cidadania conversou com o deputado federal do PSOL Ivan
Valente, que em linhas gerais conclama a mobilização popular como
maneira de barrar outro projeto de alta influência na promoção dos
direitos constitucionais brasileiros.

Para o deputado, o projeto nada mais é que uma busca de
privatização dos mais essenciais e rentáveis serviços públicos,
de modo a aplicar o projeto de reforma do Estado iniciado por Luiz
Carlos Bresser Pereira, ex-ministro de FHC. Também diz que o projeto
apenas contempla a conhecida lógica de apoio incondicional aos
setores mais poderosos de cada área, passando por cima da consulta
popular e esfacelando ainda mais os direitos dos trabalhadores que
serão atingidos.

A entrevista completa pode ser conferida a seguir.

CORREIO CIDADANIA: Como o senhor avalia o projeto de lei
complementar 92 (PLP), que regulamenta a entrada de entidades estatais
de direito privado em diversas áreas de prestação de serviço
público, como saúde (inclusive nos hospitais universitários),
assistência social, cultura, desporto, ciência e tecnologia, meio
ambiente, previdência complementar do servidor público,
comunicação social e promoção do turismo nacional?

IVAN VALENTE: Trata-se de uma continuidade do projeto de reforma do
Estado do ministro Bresser Pereira na época do Fernando Henrique, que
estabelecia critérios de mercado na administração pública, ou
seja, atacando o público para defender o privado. É um projeto de
privatização da saúde, que se coloca contra os princípios do SUS
de saúde universal, igualitária e como direito essencial.
Esse projeto, levado adiante atr avés do ministro da Saúde José
Gomes Temporão, é um atentado ao próprio SUS, contrariando o seu
foro democrático e também a própria Conferência Nacional da
Saúde, atropelando a consulta popular e a posição coletiva daqueles
que trabalham no setor.

CC: Considerando uma certa ‘inoportunidade’ desse projeto –
quanto mais partindo de um presidente egresso das classes populares e
com discurso voltado às camadas mais desfavorecidas -, não estaria
havendo forte pressão de lobbies, com pesada ingerência no
Congresso, com o fim de assumir serviços rentáveis?

IVAN VALENTE: Rigorosamente, tal medida vai realmente atender a demandas que
são muito interessantes ao setor privado.
É uma política que provoca a flexibilização das concorrências
públicas, com outros vínculos de trabalho diferentes da CLT, numa
lógica que atenta contra o sistema de seguridade social. O projeto
permite, por exemplo, que cada fundação faça seus próprios planos
de carreira e de salários. Assim, temos a possibilidade de salários
diferenciados para a mesma função, numa distorção enorme no
serviço público.
O utra questão fundamental é saber como serão controladas essas
fundações de direito privado. E aí reside um dos pontos centrais:
não haverá controle público do sistema de saúde. Qual a função
dos conselhos municipais, estaduais e nacional de saúde frente a uma
fundação estatal com esse caráter? É um problema muito grave, que
vai contra a Constituição, que, entre os artigos 196 e 200,
regulamenta o SUS e a proteção da saúde pelo próprio Estado.
Criam o Conselho Consultivo Social. Consultivo, isto é, atropelaram
o deliberativo. Fica claro dessa forma que não haverá controle
social sobre as fundações.

CC: O artigo 4º do projeto diz, neste sentido, que "a fundação
pública que celebrar contrato com o poder público poderá ter
ampliada sua autonomia gerencial, orçamentária ou financeira".
Baseando-se nos fatos recentes envolvendo tais fundações, o PLP 92
parece realmente corroborar com a falta de transparência no uso da
verba pública.

IVAN VALENTE: Não só com a falta de transparência, como também com o mau
uso dos recursos públicos e a corrupção, como já pudemos observar
em diversas clínicas nas fundações do mesmo caráter que foram
criadas nas universidades estaduais e federais. É preciso uma
investigação rigorosa sobre isso, para dizer o mínimo.
E, certamente, o processo de aumento das privatizações e falta de
controle público descamba para casos de corrupção ou falta de
transparência.

CC: Como o senhor prevê que será o futuro profissional dos
trabalhadores envolvidos em cada área que a nova lei atingir?

IVAN VALENTE: Certamente, haverá uma precarização dos direitos, algo que se
encaixa dentro dessa lógica. Passa-se por cima da CLT e o cenário
impõe uma lógica na qual os trabalhadores são vistos como recursos
humanos. Não há respaldo na seguridade social e procura-se
dificultar a aposentadoria.
Trata-se de algo que interessa à iniciativa privada, pois há
aumento do tempo de serviço exigido para a conquista da
aposentadoria, pagando-se aos aposentados menos que aos funcionários
da ativa. Uma lógica de mercado, de rendimento, que não cabe quando
se trata de responder pela saúde do trabalhador.

CC: Não é um contra-senso esta iniciativa em meio a um período
de crise, no qual até mesmo os liberais, ainda que somente no
discurso, se rendem à importância do papel do Estado no controle
social e econ�?mico? Não é demonstrativa da falta de projeto
nacional e soberano nas áreas mais importantes de nossa
sociedade?

IVAN VALENTE: Os próprios liberais e o governo Lula, como tal – dá vergonha
que o PT seja assim também –, não deixam mentir. Na totalidade da
política econômica há uma lógica liberal, de comprometimento de
quase 70% do orçamento com os juros da dívida pública e sua
rolagem, salvando o ideário que tem predominado, de socorro às
montadoras, ao agronegócio…
No entanto, os direitos dos trabalhadores e dos usuários do serviço
público têm sido atacados pelo governo, que na verdade trabalha
contra a promoção de tais direito s. Basta ver que não há
iniciativa por garantia de empregos, por distribuição de renda
ostensiva…
É preciso de muita resistência para que se impeça a sociedade de
assimilar os valores empresariais de mercado, acabando na prática com
o controle público.

CC: Já sabemos dos efeitos deletérios do atrelamento de
instituições públicas a fundações de direito público ou privado,
a exemplo da própria USP, cuja ligação com fundações,
especialmente na faculdade de Economia, tem levantado profundas
discussões relativas ao desvirtuamento do sentido maior da
educação, cada vez mais voltada a determinantes do mercado. Que
efeitos o senhor acredita que o projeto provocará no setor
educacional?

IVAN VALENTE: Na UnB também acontece o mesmo, entre muitos outros locais. A
cidade de São Paulo tem quase 40 fundações, em outros estados elas
também já são presentes; enfim, na educação, essa política já
aparece com força.
Eu diria que algumas fundações são exemplos exatos do que não
pode ser uma universidade. É preciso fazer um combate sério contra
isso tudo, no sentido de que se consiga mais transparê ncia nesses
processos.
Porém, o problema é que tal política tem o apoio de nossa mídia,
uma vez que a lógica dela é a do Estado mínimo também. Ela só se
manifesta contrariamente quando entra no ralo da corrupção, para
falar da cadeira do chefe que custou 800 reais e outros acontecimentos
do gênero. No entanto, evita discutir o essencial, no caso, o
controle social do Estado sobre o setor da educação.

CC: O setor de saúde de São Paulo é também emblemático dos
problemas advindos da ‘terceirização’. As ‘Organizações
Sociais’, por exemplo, têm recebido severas críticas relativas ao
favorecimento de grupos que prestam os serviços em detrimento do
atendimento às populações mais carentes. Com este projeto de lei
teremos a generalização do problema por vários setores e por todo o
país, não?

IVAN VALENTE: As OS e as OSCIPS vieram a partir do citado projeto de reforma de
Estado, do Bresser, e rigorosamente são um problema que precisa ser
enfrentado. Elas têm liderado a lógica de redução do Estado, que
por sua vez não faz o enfrentamento dos problemas a que se propõe,
em todas as áreas.
Por isso somos favoráveis à retomada do papel do Estado e também
à responsabilização daqueles que governam, que deveriam cuidar do
nosso projeto de sociedade e nação.

CC: Houve alguma discussão com a sociedade a fim de se averiguar o
real interesse popular em ver a promoção de seus direitos essenciais
ficar a cargo do setor privado?

IVAN VALENTE: Eu tinha esperança de que o próprio governo barrasse o projeto,
até por conta de ter promovido a Conferência Nacional de Saúde, mas
não foi o que aconteceu.
Assim, entregar um projeto desses com o apoio da oposição de
direita – PSDB, DEM, PMDB – é atirar carne aos leões. Alguns vão
resistir, pois são capazes de entender que essas áreas fazem parte
do direito social, mas será necessária muita mobilização para
evitar os avanços privatizantes.

Por Gabriel Brito e Valéria Nader
FONTE: Correio da Cidadania/