A Liberdade de Imprensa e o Direito de Acesso à Informação Pública

No Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (3 de maio), o escritório no Brasil da ARTIGO 19 lança um spot de rádio pela campanha “A informação é um direito seu!” e apresenta o relato de três jornalistas que trabalham pelo acesso à informação pública no país: Fernando Rodrigues, da Abraji, Marcelo Soares, da MTV, e Mílton Jung, da CBN.

A peça da campanha pode ser livremente veiculada por rádios comunitárias, públicas e comerciais e recebe o apoio da Unesco e da Open Society Initiative. O spot apresenta o direito de acesso à informação como parte integrante do cotidiano do cidadão, o que torna evidente a importância da imprensa. A atuação dos jornalistas é essencial para a promoção dessa garantia constitucional, tanto no próprio exercício da liberdade de expressão, quanto conscientizando a sociedade de seus direitos.

A relação fica clara quando um jornalista entrevista, por exemplo, autoridades públicas, que têm o dever de informar o cidadão sobre suas atividades. Em seu relato, o jornalista da rádio CBN Mílton Jung afirma que é comum o profissional perguntar coisas que o entrevistado não gostaria de ouvir.

“Lembro desta situação no momento em que celebramos a liberdade de imprensa, quando temos de ter consciência de que esta não existe para proteger o jornalista ou torná-lo impune. Está aí para garantir ao cidadão o direito à informação. Portanto, a liberdade de imprensa somente pode ser reivindicada se à sociedade for oferecida a liberdade de expressão“, diz o jornalista, que também mantém o Blog do Mílton Jung.

O jornalista Fernando Rodrigues, presidente da Abraji e coordenador do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, destaca a instrumentalidade do direito para o profissional: “O direito de acesso a informações públicas é indissociável do direito de liberdade de expressão. Só quem tem acesso a informações, de forma ampla, pode expressar livremente e de maneira completa seus pontos de vista.”

Marcelo Soares, repórter especial de política da MTV Brasil, lembra que o direito à liberdade de informação não é exclusividade dos jornalistas: “O direito de acesso a informações públicas é o mais desconhecido de todos os direitos fundamentais do cidadão. A noção de que alguém possa bater à porta de uma repartição pública, requisitar uma informação sobre como ela funciona e recebê-la pode ser confundida muitas vezes com um privilégio concedido aos jornalistas, mas não é: esse direito precisa estar disponível a todos os cidadãos.”

O repórter, autor do blog “E Você Com Isso?“, no site da MTV, também descreve a facilidade com que conseguiu dados sobre seus antepassados nos arquivos públicos da Suécia. O país foi pioneiro na garantia ao direito de acessar informações oficiais, quando adotou, em 1766, uma legislação que regulava exatamente a liberdade de imprensa.

Para ouvir o spot, visite este post

Confira abaixo os relatos completos dos jornalistas para a campanha “A informação é um direito seu!“:

“O direito de acesso a informações públicas é indissociável do direito de liberdade de expressão. Só quem tem acesso a informações, de forma ampla, pode expressar livremente e de maneira completa seus pontos de vista. É fundamental que o Congresso rapidamente aprove e o presidente da República sancione uma lei de acesso. Assim o Brasil dará mais um passo para consolidar e aperfeiçoar suas instituições democráticas”.

Fernando Rodrigues é presidente a Abraji e coordenador do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas

“É comum ser informado de que o entrevistado não gostou do que ouviu, ficou incomodado com a pergunta feita. Confesso que não me orgulho de provocar este sentimento, mas tenho como obsessão descobrir a verdade, esclarecer o fato e mostrar aquilo que não aparece. E que interessa ao cidadão. Nem sempre alcanço.
Na reação dos que reclamam, vejo que não entendem o papel do jornalista como alguém a proteger o direito à expressão (talvez por nossa própria culpa) nem aproveitam a oportunidade oferecida. Afinal, melhor que me perguntem aquilo que falam de mim para que eu tenha a chance de esclarecer e tirar a dúvida. Ao menos colocar um pouco mais de dúvida na cabeça de quem me julga. Entendo que o silêncio jamais revelará a inocência.
Lembro desta situação no momento em que celebramos a liberdade de imprensa, quando temos de ter consciência de que esta não existe para proteger o jornalista ou torná-lo impune. Está aí para garantir ao cidadão o direito à informação. Portanto, a liberdade de imprensa somente pode ser reivindicada se à sociedade for oferecida a liberdade de expressão.
E o acesso as informações públicas – sem as barreiras técnicas nem ideológicas – é uma das formas de garantir estas liberdades fundamentais em uma democracia”.

Mílton Jung é jornalista da rádio CBN e escreve o Blog do Mílton Jung

“O direito de acesso a informações públicas é o mais desconhecido de todos os direitos fundamentais do cidadão. A noção de que alguém possa bater à porta de uma repartição pública, requisitar uma informação sobre como ela funciona e recebê-la pode ser confundida muitas vezes com um privilégio concedido aos jornalistas, mas não é: esse direito precisa estar disponível a todos os cidadãos. Até para ajudar os jornalistas a melhorar o seu trabalho.

Por melhor que seja um repórter, é absolutamente difícil que ele consiga dar conta, em uma página de jornal, ou em um par de minutos no rádio ou na TV, de todos os aspectos da informação que interessam a cada leitor ou espectador específico. E cada leitor ou espectador específico precisa ter acesso à informação pública para fazer valer seus direitos, para saber por que raios seus parentes velhinhos precisam esperar tantos meses para serem atendidos em hospitais públicos, por exemplo.

Noutras paragens, o direito de acesso a informações públicas é estabelecido há bem mais tempo, com uma cultura de manutenção de arquivos acessíveis e servidores públicos treinados para atender às solicitações da maneira mais rápida possível, sem questionar sequer os motivos pelos quais o cidadão quer saber aquilo. O “para que você quer saber?” é irmão gêmeo do “sabe com quem você está falando?”, tão usado por aqui para defender o indefensável.

Na Suécia dos meus tataravós, o direito de acesso a informações públicas está consagrado em lei desde 1766. Hoje, eles compreendem que até os e-mails de autoridades devem ser considerados documentos públicos requisitáveis pelos cidadãos, porque isso garante o controle público de como as decisões são tomadas. Nos Estados Unidos, embora eventuais governos mais obscurantistas procurem minar a eficiência da lei, ela funciona desde 1966. Foi por conta dela que cidadãos, pesquisadores e jornalistas puderam conhecer alguns detalhes da participação até do Brasil na Operação Condor – um naco da história que por aqui nos é sonegado por uma cultura de obscurantismo e sigilos eternos.

Tive a oportunidade de me beneficiar da cultura de acesso a informações sueca por duas vezes, em pesquisa genealógica. Em 2008, em visita ao arquivo público de Malmö, forneci algumas informações básicas e em menos de 15 minutos tinha em mãos o livro manuscrito original que registrava a entrada dos meus tataravós no navio que os trouxe ao Brasil. Neste ano, um e-mail fez chegar à minha caixa postal um mapa mostrando exatamente onde está enterrada minha tataravó, que voltou à Suécia há um século e morreu. Poucos dias depois, recebi novo e-mail da administração dos cemitérios. Era uma foto atual do túmulo.

Tal presteza dos servidores públicos parece ficção científica no Brasil. Mas ela precisa ser cobrada por todos, jornalistas e cidadãos. Acesso a informações públicas é respeito ao cidadão. Porque democracia nenhuma pode funcionar se o cidadão não tem como controlar o que seus representantes fazem com o dinheiro tomado via impostos.

Marcelo Soares é repórter especial de política da MTV e autor do blog “E Você Com Isso?”, no portal da emissor