Intervenção militar: última linha do golpe e o enfrentamento social

Por Rui Muniz

A intervenção militar no Rio de Janeiro é a primeira após o golpe dos militares na década de 60. O Estado de Sítio, determinado pelo governo em uma nova versão de AI-5, está sendo ventilado desde o início do exercício de poder de Temer na execução do golpe de Estado que se instalou no Brasil ainda em outubro de 2015 e consolidado em 31 de agosto de 2016, com o impedimento da Presidente Dilma. Sob a máscara de uma intervenção humanitária e pelo bem da paz social, contra o avanço das “facções criminosas”, o governo termina por colocar os Generais no poder e adotar a última linha necessária para ter o controle do Estado, que é o controle das ações sociais. Essa decisão política complementa e extrapola as ações e intervenções já garantidas no legislativo e judiciário, a serviço das elites e mandantes do sistema político e financeiro global, que pode levar a um novo parlamentarismo moderado, aos moldes do pré-golpe de 64, até ao cancelamento das eleições.

O primeiro aceno de intervenção acontece nos primeiros meses de instalação do golpe, quando as elites não conseguiam acordar em sua superestrutura a direção e o poder a ser instalado no Brasil. Logo a seguir, às intervenções decretadas pelo governo em dezembro de 2016 e em meados de 2017, com a ascensão dos movimentos sociais, quando trabalhadores e estudantes vão às ruas para enfrentar as contrarreformas, tendo na direção as centrais sindicais, movimentos da cidade e do campo e movimento estudantil. Nesse período, o governo esboça fragilidade, e susta suas ações repressoras naquele momento pelo risco da instabilidade política e nos meios de produção e descontrole da economia; a insegurança em assumir uma medida mais forte, em meio a um Congresso ainda instável e o Judiciário ainda sem garantir o endurecimento necessário e articulado às políticas do governo, fizeram o governo recuar.

Mas, no ocasião em que se alinham o Congresso, em sua maioria, o Judiciário, em sua cúpula, as mídias sustentando o golpe e a política do governo, estão criadas as condições favoráveis quando no Rio de Janeiro são apresentadas as motivações que “justificariam” uma interferência direta, garantindo assim a intervenção militar como alternativa de ruptura com a ordem constitucional e preceitos democráticos de Estado Civil.

Mais que isso, com a intervenção, também são criadas as condições para a expansão da interferência nos Estados que podem oferecer oposição ao golpe, consolidar a desobediência civil e organizar a resistência, como São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, células importantes das organizações populares, dos movimentos sociais e residência expressiva das contradições do sistema e que afrontam a exploração capitalista.

A intervenção militar no Rio, nesse momento, em conjunto com a criação de um Ministério de Segurança e transformação do Ministério dos Direitos Humanos em Secretaria apensada ao Ministério da Justiça, significam uma mudança importante no posicionamento do governo e aponta para a alternativa de poder acordada na superestrutura do Estado.

As contrarreformas, como a trabalhista e da previdência, assim como a constitucional, que não se apresenta como tal, bem como rupturas estruturais e na democracia do Estado, intenção do golpe no Brasil, estão assim com suas condições existenciais colocadas.

A importância das reformas, do golpe e ascensão da direita no Brasil

O que é necessário também elaborar, nessa realidade, é a compreensão dos elementos externos à conjuntura que vivemos no Brasil, situada em um mesmo ambiente de intensificação das movimentações da direita na América Latina e Caribe, que acontece em diferentes países e sustentada por uma intervenção clara dos norte-americanos nas conjunturas locais.

Na Venezuela Bolivariana, por exemplo, o governo popular de Maduro enfrenta o bloqueio econômico da direita, sustentado pelo USAID, e a possibilidade de uma intervenção militar estadunidense, a clássica intervenção a partir da “ajuda humanitária” norte americana para justificar invasão a qualquer tempo; para tanto, chamam os desolados Venezuelanos a se refugiarem na Argentina e no Brasil. No Peru, outro exemplo, a mesma direita é sustentada pela intervenção da máfia de governança, apoiada pela CIA, que garante a política de golpe estrutural e se sustenta no poder. Na Colômbia, as bases militares norte americanas garantem o desequilíbrio e a hegemonia dos interesses dos colonizadores na região.

Por política e seus objetivos de direita, Argentina, Colômbia, Peru e Brasil se sustentam em Estados estruturados para atuarem nas políticas de interesse dos capitalistas e financistas, operando com força armada e com tropas e lideranças militares se tornando um comando militar unificado na defesa do Estado de Direito, das elites. Chama a atenção que essa estratégia também foi adotada no Médio Oriente, na Síria e com os mesmos intentos com relação a Cuba, que permanece até hoje como na época da Política Monroe.

Nessa conjuntura de poder global, o governo de Temer no Brasil, assim como o de direita de Macri na Argentina, têm função estratégica no continente, tanto para a política colonial de exploração, como para submissão da América Latina aos intentos dos capitalistas da América do Norte e da Europa.

Postura da Classe Trabalhadora

O governo de Temer perdeu o controle da sociedade, aprofundaram-se as crises social e da administração do Estado e possivelmente não conseguirá impor as contrarreformas da Previdência e Tributária, levando-o a se impor no discurso da lei e da ordem; a resistência demarcada pelas forças de esquerda e movimentos populares de classe deve crescer, no entanto as ações dos golpistas devem tornar-se mais agressivas, desde as judiciais como as militares e policiais.

“… o povo não deve se iludir, não partirá dos golpistas soluções democráticas.
Também devemos manter o sinal de alerta ligado. Quem procura intervir nas eleições gerais impedindo o candidato a frente nas pesquisas de concorrer é capaz de tudo.
A revolta e mobilização popular contra a Reforma da Previdência não pode ser tratada com o endurecimento da repressão do Estado contra os cidadãos e Intervenção Militar.
A Intersindical repudia este decreto que aprofunda drasticamente a agenda de retrocessos do golpe. Ou seja, a intervenção Militar vem para impor ainda mais restrições democráticas, com recrudescimento da repressão, sendo um passo perigosíssimo rumo à uma ditadura.
Portanto, a Intersindical convoca a todos a se somar a resistência a não intervenção militar e a Reforma da Previdência. Vamos manter a mobilização para o dia 19! ”
Intersindical – Central da Classe Trabalhadora

” Intervenção no Rio de Janeiro é Grave: A solução para a violência não é militarizar mais. Isso vai apenas aumentar a criminalização da pobreza. Além disso, o sinal de que o Exército é a solução para os problemas sociais e políticos nos remete a tempos sombrios.”
Guilherme Boulos – Frente Povo Sem Medo

Essa é uma breve avaliação de conjuntura com a intenção de provocar nossas visões e acumular nosso debate sobre o momento e as alternativas estratégicas para a classe trabalhadora.