Dia da Visibilidade Trans: Uma reflexão diante o atraso do Sistema

Segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), o Brasil segue em 1º lugar no ranking de assassinatos contra pessoas trans em escala global. Em 2020, foi um total de 175 casos mapeados, contra 44 nos Estados Unidos. O cenário do país diante essa problemática escancara o preconceito, a violência e a crueldade contra a comunidade.

Os mesmo dados apontam que no 1º semestre de 2021 foram registrados 80 assassinatos, 33 tentativas de assassinados, 27 violações de direitos humanos e 9 casos de suicídio. De acordo com União Nacional LGBT, a expectativa de vida de um transgênero no Brasil é de 35 anos, para mulheres trans e travestis negras a expectativa é ainda mais baixa.

Esses estatísticas refletem o descaso do Estado contra a comunidade, que também lida com a ausência de dados governamentais sobre a população total de travestis e transexuais no espaço geográfico brasileiro, o que permitiria uma noção real da gravidade da situação referente a violência letal contra travestis e transexuais em comparativo com a população geral.

Isso representa que o governo não tem compromisso com a população Trans, que ao invés vez de encarar o dado como um desafio a ser enfrentado, encara como um problema a ser escondido e ignorado, seja na prevenção ou mesmo na falta de ações a fim de garantir a segurança da população trans.

Ademais, a falta de inclusão no mercado de trabalho também é mais uma das dificuldades para travestis e transexuais. Em uma sociedade com inúmeros padrões de estética e recheada de preconceito, apenas pessoas com características físicas de um indivíduo cisgênero acabam conquistando uma vaga – isso quando não revelam ser uma pessoa transexual. Ainda, travestis e transexuais em sua maioria acabam não preenchendo as exigências mínimas do mercado, que é de ter no currículo o ensino médio completo, consequentemente viabilizando a prostituição como única forma de renda.

No dia da Visibilidade Trans, te convidamos a refletir sobre por que a sociedade não aceita gêneros diferentes, em corpos diferentes? Por que os limitamos? Por que os matamos? Veja uma linha do tempo da luta e das conquistas, ainda que poucas, do movimento no Brasil para te ajudar a entender o atraso e a precariedade do sistema:

1591: Os registros do Santo Ofício do século XVI, mostram que Xica Manicongo foi a primeira travesti do Brasil. Moradora da Baixa do Sapateiro, em Salvador, Francisco Manicongo, ou melhor, Xica, era uma negra escravizada que se tornou símbolo de resistência.

1962: Nascimento da primeira Instituição LGBTI+ do Brasil. A Turma OK, fundado no Rio de Janeiro, é o primeiro grupo de que se tem registro na história do Brasil.

1971: Em dezembro deste ano foi feita a primeira cirurgia de mudança de sexo genital em uma mulher trans no Brasil. Seis anos depois, acontecia a primeira operação em um homem trans.

1990: a Organização Mundial de Saúde (OMS) retira a homossexualidade da lista internacional de doenças mentais. A decisão transformou o 17 de maio como Dia Internacional contra a Homofobia. Fazendo as contas, isso foi 31 atrás. Apenas.

1990: Roberta Close, que foi um ícone dos anos 80 com toda a polêmica que envolvia o seu corpo, torna-se a primeira modelo trans a posar nua para a Playboy. Ela havia feito a cirurgia de resignação sexual um ano antes, na Inglaterra. A capa da revista tinha, então, a seguinte frase: “Pela primeira vez, o novo corpo de Roberta Close”.

2004: Foi instituído o Dia Nacional da Visibilidade Trans. Em 29 de janeiro, 27 transexuais e travestis foram ao Congresso Nacional, em Brasília, reivindicar seus direitos.

Assim, o Ministério da Saúde formalizou o compromisso para a saúde da população LGBT+, com a criação de um Comitê Técnico.

2006: O Sistema Único de Saúde passou a aceitar o uso do nome social, ou seja, aquele pelo qual travestis e transexuais querem ser chamados, em qualquer serviço da rede pública de saúde.

2008: Dois anos depois, o Sistema Único de Saúde cria o processo transexualizador. A partir de duas portarias do Ministério da Saúde, 1.707 e 457, o reconhecimento da orientação sexual e da identidade de gênero tornaram-se determinantes dentro da saúde. O atendimento a pessoas trans passa a ser feito com uma rede de acolhimento com uma equipe multidisciplinar de psicólogos, endócrinos e cirurgiões. O SUS passa, então, a realizar neste ano a cirurgia de redesignação sexual. Algumas pessoas trans sofrem de disforia corporal e a mudança física é parte fundamental para o processo de transição e aceitação. Em 2020, foram feitas 3.440 cirurgias desse tipo no Brasil. Hoje, a fila de espera para a cirurgia pelo SUS pode chegar a dez anos.

2009: O primeiro ambulatório de saúde do Brasil dedicado exclusivamente a travestis e transexuais foi inaugurado pela Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo. Neste mesmo ano, foi fundada a Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil – REDETRANS Brasil, instituição nacional que representa pessoas Travestis e Transexuais do País. “Um dos nossos objetivos é priorizar o fortalecimento de políticas públicas governamentais nas três esferas que ampare nossa comunidade”, explica Tathiane Aquino de Araújo, atual presidente da Rede Trans.

2016: a Defensoria Pública da União solicitou ao Conselho Nacional de Justiça que pessoas trans sem cirurgia tivessem também o direito de retificar o registro de nascimento. Assim, pela primeira vez, uma mulher trans mudou seu gênero e nome sem avaliação médica ou atestado. O caso aconteceu em outubro deste ano em São Bernardo do Campo, em São Paulo.

2017: Tiffany Abreu torna-se a primeira jogadora transexual brasileira a receber autorização da Federação Internacional de Vôlei (Fivb) para atuar com as mulheres.

2018: o Supremo Tribunal Federal autorizou que pessoas trans possam mudar nome e gênero direto no cartório, sem precisar obter autorização judicial. Pela decisão, a alteração nos documentos passa a ser feita sem a exigência de mudanças físicas ou laudos médicos.

Este ano também marcou um número expressivo de mulheres trans a serem eleitas para o legislativo federal – foram mais de 50 candidaturas.

Com informações de ANTRA e Revista Glamour.